29 de março de 2024
Velhice não é doença

Velhice não é doença

Viver é uma viagem.

O destino reservou para cada um de nós um tempo para este percurso, que começa com o nascimento, passa pela infância, adolescência, juventude, idade adulta, maturidade, até chegar à senescência, mais conhecida como velhice. Velhice, aliás, que pede uma revisão no conceito de vida e tempo, pois a longevidade é um fato novo que exige de nações e governantes um desafio adicional neste século pandêmico: enfrentar o acelerado envelhecimento do planeta. 

Aqui no Brasil, já temos mais vovôs e vovós do que bebês. São mais de 35 milhões de brasileiros com 60 anos ou mais e este cenário se altera a cada ano, pois a expectativa de vida no Brasil que era de 45 anos nos anos 50, hoje está próxima dos 80 anos. Esta mudança indica que em menos de 10 anos seremos um ‘país idoso’, que ocorre quando a população 60+ é superior à de jovens até 15 anos.

Portanto, após nascer, a única certeza que temos é que vamos morrer um dia, do quê ninguém sabe. É um segredo bem guardado por alguma autoridade que habita o universo.

Neste cenário, emergiu uma polêmica mundial, por conta de uma decisão da Organização Mundial da Saúde que, de tempos em tempos, atualiza o CID, que é o cadastro internacional de doenças, ou seja: quando alguém morre, a autoridade médica precisa informar a ‘causa mortis’, que deve estar prevista na lista da OMS.

Uma decisão técnica mal concebida pela OMS optou por classificar ‘velhice como doença’ a partir de 2022. Médicos, especialistas, pesquisadores, advogados se revoltaram contra a decisão e o protesto ocorre em todo mundo, em especial nas redes sociais. O principal argumento é que não se pode comparar velhice com câncer, Parkinson, Alzheimer, diabetes, hipertensão, entre outras doenças que afetam, principalmente, as pessoas em idade avançada.

Velhice é uma fase da vida e não uma doença!

Aliás, esta fase está sendo revista. Não se fala apenas em 3ª idade, mas sim numa 4ª e até numa 5ª idade, uma vez que é crescente o número de longevos com 100 anos ou mais em diversos países. É fato que a aceleração do envelhecimento populacional ocorreu mais lentamente nos países desenvolvidos – que puderam se organizar mais e melhor para enfrentar esse fenômeno – do que nos demais, como o Brasil.

Em 2005, uma edição da revista National Geographic já destacava 5 localidades, que abrigavam o maior contingente de longevos do mundo: Okinawa, no Japão; Loma Linda, na Califórinia/Estados Unidos; Ogliastra na Sardenha/Itália; Nikoya, na Costa Rica e Ikaria, na Grécia. Estas localidades, representadas por pequenas comunidades, ficaram conhecidas como ‘Blue Zones’ e se tornaram uma referência para outras cidades empenhadas em reproduzir o modelo e promover a qualidade de vida e, consequentemente, a longevidade de sua população. Aqui no Brasil, uma cidade que reúne diversas dessas características é o município de Veranópolis, no Rio Grande do Sul, que é considerado uma ‘Blue Zone’ do Brasil.

A pergunta que não quer calar no debate sobre a classificação de velhice como doença é: a quem interessa esta mudança?

A medicalização da saúde é um grande negócio. Certamente, a medida beneficia a indústria farmacêutica, que já faturou alto com a produção e comercialização das vacinas anti Covid-19 e, na carona, está a indústria cosmética. Afinal, se velhice será mesmo uma doença a partir do ano que vem, melhor dispor de uma linha de produtos capazes de ‘camuflar a idade’, para garantir uma boa foto na próxima selfie

O que intriga é que esta mesma Organização Mundial da Saúde publicou recentemente, o Global Report on Ageism, que é um documento mundial de análise e orientação sobre o preconceito de idade contra as pessoas mais velhas. Ora, classificar ‘velhice como doença’ não deixa de ser um preconceito, uma contradição que a OMS precisa rever urgentemente.

A expectativa é que a OMS mude de opinião, se não agora, em futuro breve. A longevidade agradece e nós também.

Escrito por
Ricardo Mucci
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