29 de março de 2024
O orçamento impossível

O orçamento impossível

O orçamento impossível

Imagem – Tartila, via Freepik

O Brasil despertou na primeira manhã de 2022 diante de uma impossibilidade: o orçamento aprovado a toque de caixa pelo Congresso Nacional para atender as demandas privadas de parlamentares do Centrão, e lobistas acreditados no Palácio do Planalto e imediações, é uma conta que não fecha.

Espremido entre a ambição da reeleição e o que resta das normas constitucionais, o orçamento da chicana produziu um corte tão profundo nos recursos para investimento público que a própria máquina do Estado poderá sofrer uma paralisação antes da metade do ano.

Em 2012, quando a então presidente Dilma Rousseff iniciava seu projeto desenvolvimentista, ainda sob os efeitos da crise financeira de 2008, o investimento definido no orçamento federal era de R$ 200 bilhões.

Somado aos investimentos privados, esse montante sinalizava para o mundo uma disposição de manter aquecida a economia, o que soava como boa música para investidores ressabiados com os efeitos da quebra de quatro anos antes.

Perturbada pela turbulenta disputa eleitoral de 2014, a festa durou apenas dois anos; já em outubro de 2015, com o início do processo de impeachment, seu segundo mandato foi progressivamente paralisado e em 2016, com o governo sitiado pela mídia hegemônica, o investimento público caiu para R$ 64 bilhões.

Ainda assim, a destinação das verbas, prioritariamente voltadas para necessidades básicas da população, permitiu criar um acolchoado para amenizar o impacto do orçamento reduzido, num contexto de aumento do desemprego.

Estado policial

O que acontece na atual transição é a tempestade perfeita: depois de haver cortado o investimento público para R$ 48 bilhões em 2021, ano em que a pandemia cobrava seu preço em serviços de saúde e em que a economia global entrava em recessão após o lockdown imposto pela Covid-19, o governo Bolsonaro determina que o Tesouro só vai investir R$ 44 bilhões.

Será o menor patamar de investimento público na história do Brasil, com a agravante de que a maior parte desse recurso está carimbada, com destinação de interesse privado: são recursos direcionados a agradar a base política do presidente Bolsonaro e a atender às demandas privadas de parlamentares e setores aos quais eles servem como lobistas.

O setor da Defesa fica com o maior quinhão, com R$ 8,8 bilhões, seguido pelo Desenvolvimento Regional (R$ 8,2 bilhões) e Infraestrutura (R$ 6,8 bilhões), estes dois ministérios responsáveis por distribuir verbas para obras que podem definir o sucesso de candidaturas nos Estados.

O Ministério da Educação ficará com R$ 3,7 bilhões para investimentos, o salário mínimo não terá reajuste real. O funcionalismo ficará seu aumento, com exceção das carreiras de policiais federais, que contarão com R$ 1,7 bilhão para reestruturação e reajuste.

Tudo a ver com o sonho do presidente, de dirigir um Estado policial.

Governo disfuncional

O orçamento 2022 reflete claramente as prioridades de um governo pressionado pela impopularidade e ameaçado de sofrer um revés nas eleições de outubro. Trata-se de abrir os cofres para os aliados da hora – que, diga-se, nunca se caracterizaram pela lealdade – e tentar reduzir o risco apontado pelas pesquisas de intenção de voto.

Mas também é o retrato de um governo disfuncional, movido por impulsos primários, pela autopreservação e o desconhecimento de como deve funcionar uma república federativa.

Além de insuficiente para prover as necessidades de setores essenciais, o orçamento federal, como foi aprovado, produz um efeito especialmente nocivo sobre a economia, porque estimula uma corrida imediata pelos recursos, pois empresários interessados em tocar obras com essas verbas sabem que o Brasil só vai funcionar no primeiro semestre.

Depois, será o salve-se quem puder das eleições.

Essa circunstância será um campo fértil para falcatruas, que já se acumularam durante os dois últimos anos, como demonstrou a CPI da Covid. Além disso, deve se repetir o fenômeno que já se apresentou em 2021: o das obras apressadas, que se desfazem antes mesmo de serem inauguradas.

Num cenário de inflação preocupante e claros sinais de recessão, o mapa do desastre está desenhado.

https://prensa.li/jornalistasonline/o-orcamento-impossivel/

Escrito por
Luciano Martins Costa
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