
Mas, segundo interlocutores frequentes do ex-presidente Fernando Henrique, ele acha que Lula não será necessariamente candidato em 2022. Ao declarar que apoiaria Lula numa candidatura contra Bolsonaro, FHC pretendeu sacudir o PSDB e lembrar que a matriz social-democrata murchou depois da morte de Mario Covas, em março de 2001.
De fato, ao assumir o governo paulista, Alckmin imediatamente se tornou refém da Opus Dei, encheu o governo de gente ligada ao Instituto Von Mises e de protagonistas sem a tradição de luta de Covas – transformou o partido numa democracia cristã fundamentalista.
Mário Covas foi o autor de um corajoso e inovador projeto de educação, que a imprensa decidiu condenar a priori. Sofreu ataques de uma ala do PT ligada à Apeoesp, chegando a tomar uma pedrada quando tentava se comunicar com manifestantes.
Essa ruptura Covas/Alckmin quebrou a espinha dorsal do PSDB e permitiu que Lula assumisse a prática da social-democracia, que, aliás, era seu berço original.
Tanto Lula como FHC acham que é boa estratégia provocar Bolsonaro com uma candidatura respaldada em pesquisa, embora seja prematuro fazer esse tipo de sondagem no atual contexto.
Parece que funciona: Bolsonaro está ocupadíssimo em viajar para o Nordeste, onde fala mal de Lula o tempo todo, e descuida de sua defesa na CPI. Ao mesmo tempo, a conversa entre os ex-presidentes, coroada pela declaração de apoio a uma possível candidatura de Lula, por FHC, mexe com os brios dos tucanos históricos que vêm assistindo à guinada do partido para a direita e a perda de identidade, e causa muita polêmica entre os petistas.
Muito revelador, por exemplo, que seja de Aécio Neves a mais ruidosa manifestação de contrariedade. Ele prefere ver Bolsonaro reeleito do que apoiar Lula.
O encontro, a declaração “voto até em Lula” e a agitação que se segue são movimentos calculados. Lula não afirmou que será irrevogavelmente candidato. Deu uma entrevista à revista Paris-Match porque sabe que vai repercutir mais no público que interessa do que falar à imprensa brasileira que, como se vê nas platitudes disponíveis, fica no “gosto – não gosto”.
Eis o que ele disse à revista francesa ao ser questionado se será candidato em 2022: “Se eu for o candidato mais bem colocado (nas pesquisas) para vencer as eleições presidenciais e se estiver com boa saúde, sim, não hesitarei”.
Esse é o apito inicial da partida. Agora cabe ao PSDB, PSD e os mais à esquerda dizerem se apostariam na social-democracia para vencer o fascismo.
A propósito: consolida-se no mercado de opiniões a tese de que já se estabeleceu uma polarização Lula-Bolsonaro. Talvez seja o caso de se considerar que a polarização se dá entre Bolsonaro, ou autoritarismo à vista, e a democracia, seja lá com que candidato for.